domingo, novembro 12

Porquê o refúgio dos cães?

O Refúgio dos Cães



Porquê o refúgio dos cães?

Porque apesar de ser um velho lugar comum a história do "Quanto mais conheço os homens mais gosto do meu cão!", a verdade é que, de dia para dia, a cada minuto que passo nesta sociedade de parecenças, na "vanity fair" pindérica que é um Portugal de tamancos e telemóvel novo, jantarinhos pirosos no restaurante chinês1 entre coleguinhas de trabalho que se suportam durante uma semana e o usam, num misto de ostentação social e poupança com o psicoterauta de grupo, como uma forma catártica socialmente bem-vista e bem-aceite, cada dia mais me revejo menos nesta Lisboa de revistas cor-de-rosa2, de gente que vive a vida dos outros por viver na mais ínfima das pobrezas e a única verdadeiramente mísera e miserável: a de vida própria, de escândalos abafados, de jornalistas que vendem a banha da cobra feita com o sangue dos outros, de putas que vendem o sangue e a imagem para que pindéricos jornalistas [façam] cócegas à opinião pública, de barbeiros de Sevilha que são especialistas em tudo e ensaboam de pseudo-cultura politicamente tendenciosa as moles infectamente amorfas e esponjosas3, por tudo isto, pelo asco que tudo isto me mete, a cada momento sinto uma maior empatia com os cães, com os vadios que pedem, aceitam ou recusam a carícia que lhes faço, com os remediados com casa, comida e sem afectos, com os maltratados, mutilados, prisioneiros, com os a quem a pretensa e onanística superioridade humana pretendeu moldar à sua imagem e roubou ou deturpou a identidade, com os felizes, com os viciados. Este é o meio em que me revejo e, se por aí houver alguém que comigo se reveja neles que entre e será bem vindo4, se com eles empatia não sentir5 que se apresse a sair!



Obrigado

1 - Se for paquistanês, tailandês, indiano, italiano, grego, mexicano ou uma tasquinha de Alfama vai dar ao mesmo.

2 - Não é boca política apenas porque esses nem merecem a minha crítica mas apenas o meu desprezo. E isto não tem cor, é geral!

3 - Qualquer semelhança entre a ficção e a vida real, não sendo fruto do acaso e completamente assumida, é mesmo real. Se duvidar belisque-se!

4 - Mesmo que ache que eu só escrevo merdas. (Isto é melhor ficar em nota porque, como os portugueses acham que as notas são umas borlazinhas com que se adornam os textos para ficarem mais bonitos ou com pinta de cultos, há sempre a vaga hipótese de, não lendo tal classificação não tenham a lucidez de a adoptar.)

5 - Apesar de achar que eu sou um gajo genial e que escreve umas coisas dignas do nome de escrita. (Isto é melhor ficar em nota porque, como os portugueses acham que as notas são umas borlazinhas com que se adornam os textos para ficarem mais bonitos ou com pinta de cultos, há sempre a vaga hipótese de, não lendo tal classificação não tenham a lucidez de a adoptar.)

2 comentários:

Sara Timóteo disse...

Ricardo, gosto do blog. Expande-o, torna-o maior. Muitos beijinhos, Sarita

Karagan disse...

O que de mais genial há neste blog... é a nota 5 das notas de roda-pé do texto de apresentação.

Adorei. Absolutamente fantástico!